sábado, 31 de janeiro de 2009

Sobre o caso Battisti


Poucos dias atrás entramos em um longo debate sobre o caso Battisti. Impressionante como a mídia conseguiu criar um senso comum e não explicou nada. Simplesmente um factóide!

Não explicam nada sobre a prisão e condenação dele na Itália. Até mesmo Norberto Bobbio já escreveu sobre os absurdos praticados pela justiça naquele período. Culpado ou não Battisti foi um perseguido político e sua extradiação tem claro sentido político. Por óbvio a tradição brasileira é de conceder asilo.

Nesse episódio foi nojento o editorial da Bandeirantes. Eles fizeram um desserviço a nação. Ainda tiveram a pachorra de citar os dois atletas cubanos extraditados... Ora, se eles são atletas da seleção de um país eles são perseguidos políticos lá? Não citam por exemplo a concessão de asilo a banda cubana que estava em Recife.

Ou ainda temos que lembrar a concessão de asilo político ao senhor Alfredo Strossner, ditador paraguaio por 35 anos, responsável por um regime que matou milhares de paraguaios e destruiu o país. Uma hegemonia colorada de anos no Paraguai, que só foi quebrada em 2008 com a eleição de Fernando Lugo. Esse asilo foi duramente criticado mundialmente, sendo aprovado no parlamento do Mercosul seguidos pedidos de revogação desse asilo político do Brasil, até que o senhor Alfredo faleceu em 2006.

Vale lembrar ainda que a Itália negou a extradição do senhor Salvatori Carcciola. Este senhor ganhou rios de dinheiro no Brasil, aplicou um mega desfalque durante o Governo FHC, contando inclusive com ajuda do presidente do Banco Central do Brasil. Mas isso não interessa falar...

Me parece que a mídia, sem pauta, tentou muito mais fazer marola do que ter razão. Reproduzo aqui uma matéria que cita OAB e outros jurista em que diz que a decisão do MJ é soberana e constitucional. Assim como uma pequena entrevista que mostra como existe jurisprudência de sobra pra justificar a escolha do Brasil.

segue então as matérias!


Decisão de refúgio político a Battisti está dentro da lei, afirmam juristas
Rosanne D'Agostino
Do UOL Notícias

A decisão do Ministério da Justiça de conceder refúgio político a Cesare Battisti é soberana e deve ser respeitada. É o que afirmam juristas sobre a concessão de status de refugiado ao ex-ativista da esquerda radical, condenado a prisão perpétua por quatro assassinatos. O anúncio foi feito na terça-feira (13) pelo ministro Tarso Genro, cujo entendimento foi criticado por familiares das vítimas e pelo governo italiano.
Condenado por quatro mortes na Itália

Cesare Battisti, ex-ativista de extrema esquerda italiano, foi um dos chefes da organização de extrema esquerda Proletários Armados pelo Comunismo; na foto de março de 2007, é escoltado pela Polícia Federal ao chegar a Brasília (DF), onde estava preso à espera do processo de extradição

Para o especialista em direito internacional Durval de Noronha Goyos Jr, a decisão do ministro é correta e segue a Constituição, que veda a extradição por crime político. "O asilo político é um ato soberano do país, que não pode ser questionado por outro. O Brasil tem plena autonomia para conceder asilo, autorizado pela legislação brasileira, e cabe ao governo a análise de cada caso", afirma.

O mesmo diz Eduardo Carvalho Tess Filho, presidente da Comissão de Direito Internacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo. "A decisão está dentro da normalidade jurídica. Há regras para a concessão do refúgio, que têm de ser respeitadas. O Ministério da Justiça tem esse poder discricionário. E não é uma decisão do ministro, é do ministério", completa.

Os advogados de Battisti afirmam que ele foi julgado à revelia, sem direito à defesa, por quatro assassinatos. Dizem ainda que, em nenhum momento, ele foi condenado por terrorismo. Battisti, que aguardava o julgamento de sua extradição no presídio da Papuda, em Brasília, afirmou sentir "alívio" com a decisão. Autoridades italianas pediram que o governo brasileiro reconsidere a liberdade, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já sinalizou que não haverá recuo. Cabe a Lula a palavra final sobre o caso.

Parecer jurídico sobre Battisti

Em parecer utilizado pelos advogados de Battisti ao requerer o refúgio, o jurista Dalmo Dallari defende a concessão com base na Constituição Federal. Ele afirma, citando o ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Sepúlveda Pertence, que, no caso de crimes políticos, é vedada a extradição.

Planos para a liberdade

Após decisão, Battisti afirma que refúgio é um alívio e que faz planos para retomar carreira de escritor

Para Durval Noronha, "a desordem italiana traz consequências jurídicas, insegurança". "Na época, havia uma convulsão política que se aproximava de uma guerra civil, e a Itália jamais anistiou seus perseguidos políticos. Aqui no Brasil, mesmo com a anistia, temos ainda a questão da tortura", afirma.

Dallari diz que o entendimento não foi considerado pelo Conare (Conselho Nacional de Refugiados) por "excesso de trabalho ou inadvertência" e que o refúgio se justifica porque, além de Battisti ter sido julgado por um tribunal viciado, o italiano teme retornar ao país de origem.

"Uma decisão em tal sentido será coerente às disposições constitucionais e será, essencialmente, um ato de soberania do Estado brasileiro", escreveu.

O constitucionalista também avalia que decisões relativas a asilo político levam em conta fatores políticos, mas defende que não se pode acusar Tarso Genro de ter tomado uma decisão política.

"Há sérios indícios, analisados com mais profundidade pelo governo brasileiro, de que Battisti foi condenado à revelia, sem o devido processo legal. Está bastante claro", diz Noronha.

"Se o Ministério da Justiça estava convencido de que ele corre risco se for extraditado, é um direito conceder asilo, está na legislação", completa Tess Filho



O Estado de S. Paulo - 29/01/2009
Giuseppe Cocco: "Governo seguiu a jurisprudência do STF''

Há 14 anos no Brasil, o italiano Giuseppe Cocco, doutor em história social pela Universidade Paris I e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, aplaudiu a concessão do refúgio político a Cesare Battisti. A seguir, trechos de entrevista concedida por telefone:

O Brasil agiu corretamente ao conceder o refúgio político a Battisti?

O governo brasileiro fez bem, na medida em que confirmou a jurisprudência do STF em relação a outros italianos (ligados à luta armada). Battisti foi condenado à revelia, então não teve direito a ampla defesa. A decisão brasileira é técnica e, ao mesmo tempo, tem a dimensão do reconhecimento político de que Battisti fez parte de um movimento nos anos 70 e que a repressão daquele movimento passou por uma dinâmica específica, com leis especiais. A grande imprensa se refere ao ?terrorista Battisti? como se tivesse agido ontem, mas estamos falando de coisas acontecidas entre 30 e 40 anos atrás. O ministro Tarso Genro tem razão ao dizer que a imprensa teve comportamento diferente quando ele propôs a rediscussão da punição aos torturadores. Aí disseram que era coisa do passado.

Como o sr. vê a reação da Itália?

O governo italiano e o conjunto da classe política estão protestando com uma dupla postura. Eles nunca convocaram seu embaixador em Paris quando a França deu abrigo não a um ou dois, mas a centenas de italianos. Com o Brasil a atitude é neocolonial. Segundo, quando falam das vítimas, por um lado têm razão: é um período triste, duro, e as famílias não entendem a posição brasileira. Mas os mesmos que falam da dor das vítimas não veem problema no fato de que leis da própria Itália premiaram um monte de assassinos, que circulam livremente no país, com períodos curtíssimos de prisão.

3 comentários:

Unknown disse...

Contribuindo para o Factóide: Há uma ficha detalhada da polícia italiana de um jovem cidadão nascido em Cisterna Latina, região do Lazio, em 1954. Aos 18 anos, a 13 de março de 1972, Cesare é preso pela primeira vez por furto agravado. Dois anos depois, a 19 de junho, preso novamente por lesões pessoais agravadas. Preso ainda a 2 de agosto de 1974, por rapina agravada e sequestro de pessoa. Denunciado a 25 de outubro do mesmo ano por desfrutamento de incapaz (por debilidade mental ou menoridade) para a prática de atos libidinosos. Preso em Udine, norte da Península, em 1977, por rapina. Admitamos, não é uma ficha enaltecedora do caráter e das tendências de qualquer um.
É Bom lembrarmos também da recente "re"decisão do PGR, que recomendou o arquivamento do processo. Sabe-se que a repentina mudança de opinião se deu pelo fato do ilustríssimo sr. Antônio Fernando de Souza ter sido incluído na lista dos prováveis indicados à próxima vaga no STF.

Rafael Pops disse...

legal os dados, impressionante como nenhum dos dados fornecidos servem de dados pros autos do processos que o condenou a prisão perpetua. Nem mesmo pra justiça italiana!!!

enfim, adoro o contraditório, aquilo que não foi feito com réu na Itália!

Unknown disse...

Não há como haver contraditório se o acusado foge para não ser julgado.

Mais um dado.
Jurisprudência: asilo não impede extradição

“Refugiado” ou “asilado”, o terrorista italiano Cesare Battisti não está totalmente livre da extradição, sob julgamento do Supremo. Em um caso de 1991 relatado pelo ministro Celso de Mello, a Corte considerou que “não há incompatibilidade absoluta entre o instituto do asilo político e o da extradição, na exata medida em que o STF não está vinculado ao juízo formulado pelo Poder Executivo” na concessão do benefício.
E agora, Tarso???